quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Ano 2, Nº10 – Novembro/2011

Psicologia e Família - ISSN 2176-8005
 
EDITORIAL: Apresentamos o Cenas, edição 10, que traz reflexões sobre a Família, essa tão mitificada instituição, chamada de célula-mater da sociedade que parece estar adoecida. O primeiro artigo, escrito por uma ex-acadêmica recém formada pelo curso de Psicologia da UNESC/RO, traz uma discussão sobre a dor do rompimento de laços afetivos decorrente de abandono/separação conjugal dos pais. O segundo e o terceiro trabalhos, escritos por nós e dialogando com o primeiro, abordam: a constituição familiar a partir do elemento basal da afetividade, para além das configurações externas estereotipadas e da consangüinidade (“famíliafeto”); o outro aborda o fenômeno pós-moderno do “desenlaçamento do laço familiar” em decorrência de um delençamento social maior, trabalho apresentado num congresso de psicologia jurídica. 

Boa leitura e boas cenas! 
Prof Ms Cleber Lizardo de Assis, Editor.

ARTIGOS:

A dor do rompimento dos laços afetivos
Famíliafeto: A família como laço afetivo no Direito e na Psicologia
Desenlaçamento familiar: notas sobre o rompimento dos laços sociais, familiares
e os desafios à Psicologia e ao Direito
[Cena] Acadêmica/Social: Assistência Psicológica a estudantes






A DOR DO ROMPIMENTO DOS LAÇOS AFETIVOS
Solimar Felix[1]

“Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes”. (Lei nº 8069/90 – ECA. Art. 19)

Um caso vivenciado no estágio
Quando estava no 9º período de Psicologia no ano de 2010 tive a oportunidade de acompanhar no local onde fazia estágio (PETI - Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) juntamente com outras colegas, o caso de uma das crianças que participavam do programa. A criança era um menino com nove anos de idade. Ele sempre chamou nossa atenção pelo fato de expressar em seu rosto um olhar tristonho e ao mesmo tempo de revolta/agressividade.
Começamos a observá-lo e percebemos que a criança sempre chegava atrasada nos encontros que era no período matutino. Verificamos então que o motivo do atraso era devido ao fato do menino ir logo pela manhã à Câmara Municipal que fica ao lado do PETI, para pedir chá aos funcionários. Ao investigar mais profundamente descobrimos que esse menino foi abandonado pela mãe, seu pai era bastante ausente devido ao fato de trabalhar em outro local e, no momento estava morando somente com a avó paterna que não tinha condições físicas nem psicológicas de cuidar da criança, devido sua idade avançada. 

A separação dos pais e o abandono dos filhos: qual será o destino dessas crianças?
Não fiquei surpresa quando averiguamos o histórico familiar desse menino, pois nos dias atuais os abrigos estão lotados de crianças à espera de adoção. Além dos casos de abandono pela mãe, há menores que foram vítimas de abuso sexual, meninas que engravidaram do próprio pai, crianças que tiveram todos os irmãos adotados e se sentem rejeitadas porque não foram escolhidas por uma família substituta. Há também os adolescentes que foram separados dos pais após inúmeras agressões físicas. Outros foram adotados e, depois, devolvidos pelas famílias substitutas sem explicações.
A função de um pai e de uma mãe é também de ajudar o filho a se constituir como pessoa – real e humana, para que ele possa ser e se reconhecer. Posto que a família seja condição indispensável para que a vida se desenvolva regularmente, com a formação segura da personalidade do indivíduo. Mas infelizmente, nem sempre é isso que acontece. A solidão infantil está presente em seu cotidiano, essa criança, desamparada, tem de se tornar autônoma bem mais cedo, passando desde a instabilidade das formações familiares à ausência dos pais.
Antes, a questão econômica era a principal causa da separação de pais e filhos. Hoje, a violência doméstica - inclusive o abuso sexual - lidera o número de ocorrências, seguida pelo abandono provocado pelo vício em drogas. Nos dias de hoje, é angustiante para muitas pessoas, pensar que uma mãe não ame seu filho, ao ponto de abandoná-lo. 


As conseqüências de um abandono
No caso citado acima observamos que além da dor do rompimento dos laços familiares, foi gerado nessa criança uma série de conseqüências negativas, principalmente psicológicas. A questão econômica ainda existe, mas os casos de traumas sociais e emocionais pesados superaram essa condição. Muitas mães abandonam os filhos durante os fins de semana por causa das drogas. São casos de abandono temporário. Nesses dias, a chefe de família deixa até os filhos pequenos sozinhos por causa da dependência química.
É delicado falar de relações de afetividade. Não que os pais sejam obrigados a amar ou a ter envolvimento afetivo contra sua própria natureza, mas é fundamental que permaneça a manutenção dos vínculos com os filhos e a sua ausência pode desencadear prejuízos muitas vezes irreparáveis ao ser humano em constituição.
É possível que devido este problema ocorra um desencadeamento de muitas doenças físicas, que têm gênese também nas suas fugas em não se ‘re-conhecer’ como pessoa, causando abalo de sua auto-estima.

A superação do trauma vivenciado e a contribuição da psicologia
Atualmente não é possível falar em doenças sem uma consideração das dimensões psicológica e emocional. A psicologia tem lugar fundamental na saúde – ela tem uma visão integrada do homem. Ela é tida como um valioso recurso para lidar com dificuldades da existência humana e com todas as formas de sofrimento.
A família passa hoje por uma transformação muita intensa, o problema da família evidencia-se muito mais, apresentando a configuração familiar de uma forma muito diversa.
Envolvidos nestes problemas parentais, as crianças começam a ter problemas na escola, nos relacionamentos com seus amigos e parentes. Nesse momento é fundamental que o trabalho com as famílias seja possível, para que se possa questionar aquela verdade que os sujeitos construíram no drama familiar. Nestes casos podemos falar de criança como sujeito que adquira o direito de, pelo menos, ser preservado da violência simbólica do sintoma parental.

Referências:

CASSETTARI, Christiano. Responsabilidade civil dos pais por abandono afetivo de seus filhos - dos deveres constitucionais. In: Revista IOB de direito de família. n. 50, outubro/novembro/2008, p. 87-99.

MARTURANO, A. C. A função dos pais é ajudar o filho a se constituir como pessoa. Seção Opinião, Especial para o G1. São Paulo em 29 de Abril de 2010; Disponível em: < http://g1.globo.com/vestibular-e-educacao/noticia/2010/04/opiniao-funcao-dos-pais-e-ajudar-o-filho-se-constituir-como-pessoa.html>, Acesso em: 11/jun/2011




[1] Psicóloga, graduada pelas Faculdades Integradas de Cacoal - UNESC/RO. Email: soly_felix@hotmail.com






Famíliafeto: A família como laço afetivo no Direito e na Psicologia[1]
Cleber Lizardo de Assis[2]

As mudanças na apreensão do conceito de família na atualidade, nos conduzem à uma reflexão acerca das suas transformações a partir da promulgação da Constituição Brasileira de 1988.
Essas mudanças podem receber como contrapartida alguns aportes da Psicologia, em particular da Psicanálise que tematiza em côro com certa tendência do Direito Civil, a emergência de uma família des-naturalizada, determinada por laços afetivos e que se coaduna com o espírito cidadão da novel Constituição, podendo trazer amplas repercussões sociais no contexto social brasileiro.


Breve aproximação do conceito de família
Sem realizarmos uma digressão histórica do conceito e da evolução das configurações do modelo familiar, ressaltamos que tais mudanças vêem sendo realizadas através de muitas gerações e todas tem contribuído de alguma forma para as percepções e definições de família que portamos na atualidade.
Segundo Pereira (1994) “A idéia de família é um tanto quanto complexa, uma vez que variável no tempo e no espaço. Em outras palavras, cada povo tem sua idéia de família, dependendo do momento histórico vivenciado.” (PEREIRA,1994, p. 243).
Em todas as culturas, em todos os tempos históricos a família tem sua função e peculiaridades. Trata-se de uma forma particular e ao mesmo tempo universal de organização, instituição, mas também de percepção de mundo a partir de vivências e culturas.
            No código civil de 1916, o modelo jurídico de família está fundamentado numa concepção de origem romano-cristã, onde a família é vista como “núcleo fundamental da sociedade, legalizada através da ação do Estado, composta por pai, mãe e filhos (família nuclear) e, secundariamente, por outros membros ligados por laços consanguíneos ou de dependência. (BRANDÃO e GONÇALVES, 2004, p. 55)
            No entanto, esse modelo familiar predominante, nuclear, patriarcal e fundado nos laços sanguíneos vem dividindo espaço para outras formas de configurações familiares na contemporaneidade; podemos citar, por exemplo, o modelo da união estável, da comunidade monoparental, da homoparentalidade e outras variações.

A desnaturalização da família na/da lei
            A instituição família é definida e defendida pela Constituição Brasileira de 1988, no seu Art. 226 como “base da sociedade” e nos seus parágrafos terceiro a quinto, atribui contornos do modelo nucleares à instituição familiar, privilegiando as configurações formadas por homem e mulher, ou aquela formada por qualquer um dos pais e seus descendentes.
Assim posto, entendemos a legitimação da Carta Magna do país de um modelo específico de família, o nuclear e consangüíneo (como também a monoparental) que na atualidade não deixa de existir, mas se expande e ganha contornos a partir das diversas modalidades ou configurações familiares atuais que insistem em apontar os laços afetivos prevalecem sobre os sanguíneos.
            Lôbo (2002) fala das características definidoras de uma família, qualquer que seja sua modalidade, como devendo ter afetividade como fundamento, a estabilidade/temporalidade e a ostensibilidade ou certa publicidade.
Para Farias (2009) parece de uma reflexão onde “não existe, efetivamente outra instituição tão próxima da natureza do homem como a família”. (FARIAS, 2009, p. 2), para extrapolar esse modelo naturalista que funda um modelo familiar estatal, para apontar o cultural, de onde emerge os grandes desafios ao direito.
            Essa naturalização do modelo nuclear como modelo de família que opera em nossa sociedade, com repercussões no campo jurídico e psicológico, evocam a argumentação segundo o qual o fator biológico regeria uma tendência a união, e onde “o impulso natural do instinto sexual, do amor materno e a tendência do homem para que outros o continuem dão, sem dúvida vazão à família de modo imediato.” (FARIAS, 2009, p. 6).
            Dessa herança biológico-naturalizante, depreendemos em nossa atualidade a velha questão do antagonismo natural-biológico versus cultural, agora aplicado ao conceito de família: sua constituição é necessariamente biológica ou pode se assentar sobre bases culturais dinâmicas ao longo do tempo?
            É notável nesse embate como a construção cultural da sociedade e sua relação com os aspectos biológicos dão forte sustentação às formações das estruturas familiares existentes, sem no entanto, tenhamos que excluir a priori essa ou aquela dimensão como determinante do conceito de família.
            Um dos problemas nesse caso, e falamos do Brasil, a Constituição da República, legitima e consagra sob a forma de lei um modelo tradicional que parece desatento à dinâmica social e cultural de seu tempo; outro problema são os impactos e implicações sociais, econômicas e subjetivas para sujeitos que não pertençam a um modelo privilegiado pelo seu país e pela lei que o rege.
            Ocorre que a lei e todo aparato jurídico legitimam um modelo familiar, o que fortalece uma tendência a também naturalizar o modelo familiar nuclear, por exemplo, quando a realidade brasileira pede por uma desnaturalização e a uma culturalização das relações sociais, sobretudo nas configurações familiares.

Mal-estar na desnaturalização da família
            As mudanças que se dão no mundo contemporâneo têm forte influência na busca do sujeito por uma mínima realização no campo da afetividade e das relações sociais, precisando do aval do Estado e da lei, de forma que possam legitimar essas novas formas de expressões, o que conduz a impactos sobre o modelo clássico de família.
            Nesse sentido, Pereira (1999) nos fala o seguinte sobre nosso contexto atual e sua relação com o modelo familiar, sobretudo nuclear, patriarcal e consanguíneo:
O declínio do patriarcalismo, a globalização e a redivisão sexual do trabalho, somados à evolução do conhecimento científico, provocaram uma grande transformação da família, especialmente a partir da segunda metade deste século. Com isso, os paradigmas estruturadores da organização jurídica sobre a família, o sexo, o casamento e a reprodução desatrelaram-se. Não é mais necessário o sexo para a reprodução e o casamento não é mais a única maneira de se legitimar as relações sexuais.(PEREIRA, 1999, p. 6).




            Existem várias formas de se constituir uma família e um fator interessante é que as pessoas na atualidade vêm a instituição casamento de várias formas, nem sempre se unindo baseados em paradigmas antigos de afetividade, de relacionamento e de constituição de laços familiares. Assim, se flexibiliza e se permite de forma bem expressa, vários tipos de variantes e fatores que, por sua vez, levam a várias formas de “casamento”: desde por amor, por interesse, para simplesmente sair de casa na busca de se encontrar, por busca de parcerias econômico-profissionais, de busca no outro de um refúgio particular ou simplesmente como escolha para uma parceria amorosa.
            A família da atualidade é marcada pelas diferenças, pelas peculiaridades de nosso tempo e não menos por sua complexidade. Mesmo que tentemos falar de um modelo de família na atualidade percebemos que este cai por terra, pois existe algo de um plus subjetivo em cada vivência familiar formal e sempre operando de forma inconsciente.
Embora necessitemos de uma concepção para servir de base para a sociedade, algo sinalizado pela lei e pelo aparato jurídico como norma, esse modelo não pode se tornar restritivo à dinâmica social, cultural e afetiva dos indivíduos; uma concepção de família, tal como eleita na Constituição não deve criar barreiras para as possibilidades de invenção “de família” dos seres humanos, pelo contrário, deve apontar para soluções legais em que o Estado favoreça e proteja seus cidadãos para além de seu tipo de pertencimento familiar.
            Essa flexibilização ou ampliação do conceito família deve ser fortalecido pela lei que enxerga essa instituição básica da sociedade em toda a sua polissemia, com a dinâmica sócio-afetiva de seus cidadãos e cidadãs:
A travessia da família para o novo milênio está se fazendo com concepções e valores morais totalmente diferentes dos da primeira metade do século XX. Estamos ainda atônitos, pois, em meio a esse processo, não temos a clareza e o entendimento dessas mudanças como temos daquelas do início do século. Mas podemos anunciar uma “boa nova”. A grande mudança da família é que ela deixou de ser apenas um núcleo econômico e de reprodução para ser o espaço do companheirismo, do amor e da livre expressão de afeto. (PEREIRA, 1999, p. 7)

            No entanto, se essas mudanças sociais e culturais ocorridas no último século permite novas expressões de afeto e de configurações de laços amorosos, o que aponta para as diversas possibilidades de formatações existentes de família, notamos a resistência à essa dinâmica sob a forma da lei que parece resistir junto com um pensamento religioso que vem consagrado um modelo familiar e com ampla influência no meio legislativo-judiciário e no Estado brasileiro.
            Ora, como profissionais do “campo psi”, sabemos da importância da lei estatal que ampare seus concidadãos que integram esses diferentes modelos familiares que não o tradicional; estamos falando de como a lei instituída na forma da letra pode ser importante instrumento que, além de garantir direitos e deveres, também legitime a sobrevivência social, afetiva e psíquica desses sujeitos.
            E a psicanálise tem se constituído num campo de “saber desnaturalizador por natureza”, podendo contribuir para desconstruir uma “mítica da família natural” que predomina em nossa sociedade, onde prevalece o status, o sexo biológico e o sangue; nesse sentido, podemos sinalizar um conceito familiar baseado na linguagem lacaniana, por exemplo, onde “família é uma estruturação psíquica em que cada membro ocupa funções e lugares determinantes” (Pereira, 1999, p. 7).
            O próprio Freud (1915, 1916) ao criar a psicanálise, o fez sobre uma radical desnaturalização da idéia de uma essência de humano, sobretudo ao desnaturalizar a constituição da sexualidade e do psiquismo: daí a apreensão de que, ao distanciar do natural-animal, o humano se constitui no cultural, na linguagem e torna-se um ser pulsional.
Postulemos em sentido psicológico e jurídico, por conseguinte, família como relação afetuosa de pessoas agenciadas pela via do desejo de estarem umas com as outras, independente da cor, sexo, classe, credo e do motivo pelo qual elas se aproximaram; família como constituída de diversas configurações onde cada membro possui sua dignidade humana que deve prevalecer sobre o modelo social.

Enfoques e desfoques no Direito e na Família
            A Constituição de 1988 desfocou o casamento como elemento definidor único da configuração de família e ao desfocá-lo, abriu chancela para outras modalidades de vinculações afetivas e para aceitar como dignas e passíveis de direito, outras “unidades de vivência”, tais as como as famílias monoparentais e aquelas formadas pela união estável.
            Lôbo (2002) parece falar de certo privilegiamento do casamento vigorando na sociedade e no meio jurídico, no entanto destaca que após 1988,
consulta a dignidade da pessoa humana a liberdade de escolher e constituir a entidade familiar que melhor corresponda à sua realização existencial. Não pode o legislador definir qual a melhor e mais adequada” (LÔBO, 2002, p. 43).

            O principal avanço foi desfocar, portanto a modalidade ou instituição casamento para fazer prevalecer dignidade e a liberdade da pessoa humana, numa perspectiva de cidadania, sobre uma configuração única de família.
            Ao valorizar a pessoa humana, em detrimento de uma modalidade de vínculo afetivo o Estado não se despensa de proteger “uma” família de modelo cristalizado, mas se abre  “à família” em suas múltiplas possibilidades de configuração.
            Outras modificações legais e com amplas repercussões sociais ocorrem quando o Estado “legitima” filhos dantes chamados “bastardos”, oferecendo-lhes sua tutela, condições  de igualdade e todos os direitos em relação aos filhos do casamento.
            Com a criação da lei 8.069, Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, as crianças e adolescentes tiveram no ordenamento jurídico um aperfeiçoamento na proteção e defesa de seus direitos, co-responsabilizando os pais, os responsáveis, a sociedade civil e o próprio o Estado.
            O enfoque sanguíneo, definidor tradicional da paternidade/maternidade, também decai apoiado pelo avanço da tecnologia que vem denunciado muito pais sanguíneos despreparados e omissos na sua função paterno/materna, o que abre possibilidades para focalizar a maternidade/paternidade pelo viés da afetividade.
Tem havido, inclusive, casos em que filhos “provados” via exame de dna passaram a pleitear indenizações por danos morais de pais que apenas os assumiram materialmente e não o fizeram afetivamente: assim, nosso tempo nos aponta uma família desnaturalizada e uma maternidade/paternidade como funções, sobretudo psíquico-afetivas.
Ceccarelli (2006) discorre sobre as transformações sexuais, culturais e sociais em torno da família, sobretudo, a crise da masculinidade e do patriarcado, sobre as novas formas de procriação, de filiação e maternidade/paternidade, levando a novas formas de subjetivação na pós-modernidade; dentre essas modificações destacam-se as relações homoeróticas e as “homofamílias”, isto é, famílias constituídas por casais homossexuais.
            Esse campo sem precedente jamais visto na modernidade, exige um repensar dos novos modelos de vivências familiares, e que ainda não possuem uma legislação específica, senão ações isoladas que, assegurem, por exemplo, o direito a uma família homoparental com suas reivindicações por formalizações de uniões, de adoções e outros direitos sociais.
            O Estado brasileiro parece sinalizar avanço na sua legislação civil e familiar, a partir de demandas e pressões da dinâmica social, sendo desafiado a atuar numa perspectiva de inclusão, da cidadania e na preservação da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, “o campo psi”, em particular a Psicanálise e o Direito, articulados, têm muito a contribuir.
Considerações Finais: Contribuições da Psicologia e do Direito nas novas configurações familiares
            A própria Constituição de 1988 quando promulgada, não possuía a consciência da dimensão dos desafios que anunciava acerca das relações sociais e civis, no entanto representava um grande avanço no aparato jurídico em resposta ao que exigia a sociedade.
            O cenário histórico e social contemporâneo exige um exercício vigilante da psicologia acerca das rápidas modificações familiares e dos processos de subjetivação de nosso tempo; cabe aos diversos campos de saber, às ciências humanas, ao direito e à psicanálise nesse particular, investigar e contribuir para respostas aos novos desafios éticos, sociais, técnicos e ideológicos.
Diante dessas novas configurações de família, caberia ao profissional da psicologia “desnaturalizar” ou historicizar mais o conceito de família, sobretudo a partir das mudanças que essa instituição vem sofrido historicamente.
A psicanálise como “ciência do singular” e “saber desnaturalizante” não se atém às generalizações, no entanto, pode contribuir nessa temática das novas configurações familiares, fortalecendo sua interface com o direito, particularmente o direito civil, palco desses embates por que passa nossa sociedade.
Para isso, tanto a psicanálise como o direito devem evitar o risco de privilegiamento de determinado modelo familiar, por exemplo, o nuclear, sanguíneo e patriarcal incrustados em nossa subjetividade e práticas, buscando um aprofundamento nos estudos desses outros modelos e arranjos familiares, de forma a assegurar sua legitimidade jurídica e psíquica.
A psicologia, particularmente a psicanálise pode contribuir para uma discussão multi e transdisciplinar dessas transformações, investigando as repercussões subjetivas e sociais desses modelos.
Mais uma vez, enfatizamos que, desafio ideológico e ético, esses campos de saberes devem se evitar privilegiar qualquer o modelo ou arranjo familiar como único e como da ordem da naturalidade, mas se ocuparem de empreender uma política em prol da dignidade humana.
Quanto ao desafio epistêmico, técnico e metodológico, cabe à psicanálise e ao direito a ampliação do diálogo e da pratica interdisciplinar, de forma que o direito receba as contribuições da psicanálise acerca da compreensão dos processos psíquicos humanos, enquanto a psicanálise seguiria os veios do arcabouço jurídico para pensar sua reflexão e prática.
As experiências nos fóruns e tribunais, a partir das demandas processuais civis, atestam que essa relação entre direito e psicologia/psicanálise é urgente e salutar, o que pode ser aperfeiçoada desde a academia onde o acadêmico se familiarize com o trabalho interdisciplinar, onde essa articulação se pautasse numa relação simétrica, sem que um saber seja subserviente ao outro.
            Parece-nos que, nesse específico, desnaturalizar um conceito de família tradicional, exige que disciplinas como o direito e a psicanálise também “desnaturalizem” suas regulações e protocolos, de forma a apreender o novo que pulsa na realidade social contemporânea.
Finalmente, cabe ao direito e à psicanálise, em uníssono, mas sem evitar o confronto e a tensão interdisciplinar e com a sociedade, apregoar o laço afetivo, psíquico, como lei maior que marca a configuração do que temos chamado de família.
            Ganham os campos de saberes, mas, sobretudo, os cidadãos que acessam seus serviços em busca de respeito e dignidade, valores preconizados na Constituição brasileira.

Referências:
BRANDÃO, Eduardo Ponte; GONÇALVES, Hebe Signorini. Psicologia Jurídica no Brasil. Editora Nau, Rio de Janeiro, 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988, acesso em: 20/04/2009,

CECCARELLI, Paulo Roberto. Configurações Edípicas da Contemporaneidade: reflexões sobre as novas formas de filiação. In: Pulsional Revista de Psicanálise, São Paulo, ano XV, 161, 88-98, set. 2002

 

FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito à Família. Acesso em: 20/04/2009,

disponível em: http://www.facs.br/revistajuridica/edicao_marco2004/docente/doc04.doc


FREUD, Sigmund (1915). O Inconsciente. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas. Vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

FREUD, Sigmund (1916). A pulsão e as suas Vicissitudes. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas. Vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996.


LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades Familiares Constitucionalizadas: para além do numerus clausus. In.: Revista Brasileira de Direito de Família, v.3, n.12, Porto Alegre: IBFAM, 2002.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concumbinato e união estável. Belo Horizonte: Del Rey, 1994.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Repensando o Direito de Família. Belo Horizonte: IBFAM, 1999.




[1] Artigo originalmente apresentado e publicado junto ao 1° Congresso Nacional Direito, Psicanálise e Literatura, 15 e 16/mar/2009, Faculdade Milton Campos, Nova Lima, MG – Disponível em: http://conpdl.com.br/conpdl_anais.pdf
[2] Psicólogo. Mestre em Psicologia/Processos Psicossociais-PUC MG; Doutorando em Psicologia/USAL-AR. Docente das Faculdades Integradas de Cacoal. Email: kebelassis@yahoo.com.br



Desenlaçamento familiar: notas sobre o rompimento dos laços sociais, familiares e os desafios à Psicologia e ao Direito[1]
Cleber Lizardo de Assis[2]

            Vimos discutindo a diversidade que abarca o conceito família, com suas variações históricas e culturais, como necessitada de suporte jurídico para sua afirmação na atualidade, sobretudo, com o privilegiamento dos laços afetivos sobre quaisquer outros dispositivos que tenham surgido no decorrer da dinâmica social e histórica (Lizardo de Assis, 2009; Pereira,1994).
Se o código civil brasileiro de 1916 afirma um modelo jurídico de família fundamentado numa concepção de origem romano-cristã, de configuração nuclear e consangüínea e devendo ser sustentada pelo Estado (Brandão e Gonçalves, 2004), esse modelo familiar nuclear, patriarcal e consangüíneo vem dividindo espaço com outras formas de configurações familiares na contemporaneidade, sobretudo após a Constituição Brasileira de 1988.
Esses novos modelos, configurações ou arranjos familiares, quais sejam o modelo da união estável, da comunidade monoparental, da homoparentalidade e outras variações, apontam a plasticidade e o caráter de uma familia plural, de uma família-devir, onde o afeto, a estabilidade/temporalidade, a ostensibilidade, a publicidade (Lôbo, 2002) e os papéis simbólicos da parentalidade emergem como determinantes.
No entanto, se existe um mal-estar no que chamamos de “desnaturalização” do conceito tradicional de família diante de novos modelos e arranjos familiares, nos deparamos com uma problemática anterior e talvez relacionada, a saber, certo desenlaçamento social que abarca quaisquer desses modelos familares.

Situação pós moderna e instituições familiares
            Temos adotado a noção de pós-modernidade para se denominar esse nosso ethos contemporâneo, a partir de autores que o caracterizam como “sociedade pós-tradicional” e “modernidade tardia” (Giddens,1995), “modernização reflexiva” (Beck, 1995) e  “modernidade líquida” (Bauman, 2001).
Mesmo que tal terminologia não seja definitiva e contestada por outros pensadores, a pós-modernidade tem sido caracterizada por um tempo marcado por elementos como a fragmentação, a complexidade, a imprevisibilidade, o consumismo, o tecnologismo.
Em contraposição à idade antiga, média e moderna, a pós-modernidade tem sido marcada pela ausência de uma lei homogênea, de referências ordenadoras de sentido e sem um telos (grego, senso de futuro) orientador do sujeito.
Mais que uma mera localização cronológica e um conceito, a pós-modernidade também vem se constituindo como outro ethos com seus respectivos valores e seus modos de subjetivação.
            E se o advento da modernidade possibilitou diversos pluralismos e sociedades autônomas de sentido, produziu novos sistemas de valores e interpretação “descanonizados”, mas também crises de sentido no sujeito, um relativismo generalizado e crises subjetivas e intersubjetivas já que agora, o indivíduo se encontra emancipado de uma ordenação religiosa (BERGER E LUCKMANN, 2005: 37-40).
Esse nosso tempo ainda tem seu “espírito” marcado por um desencantamento diante das utopias políticas, mas também de questionamento da própria ciência positivista; a exacerbação do individualismo e a ausência de projetos humanos coletivos; certo ceticismo e relativismo ético-moral; grande ênfase na heterogeneidade, nos pluralismos e no múltiplo; intensificação dos usos das tecnologias e dos meios de comunicação de massa; enfraquecimento do Estado e dos laços sociais.
Destacamos desses elementos presentes na pós-modernidade e no tocante ao conceito múltiplo de família, para destacar o enfraquecimento ou desenlaçamento do laço social decorrente desse estado de coisas.
Por laço social, nos baseamos em Freud (1913) sinalizador de que a compreensão do social remeteria ao estudo dos fenômenos tabus e totêmicos, e nesses estudos, o privilegiamento da proibição do incesto como lei universal e a conseqüente morte do pai da horda primeva como eventos fundantes da humanidade, da cultura e do social.
Freud, portanto, de um mito opera um salto que aponta através da sua clínica psicanalítica, o desejo inconsciente, individual e coletivo, filogenético e ontogenético de morte, denunciando a fragilidade da sustentação do socius diante de situação de solidariedade e fraternidade que se buscam.
Segundo Enriquez (1990) a psicanálise freudiana revela que o vínculo ou laço social localiza-se na divisão e conflito do ser pulsional-ser social, no embate entre desejo e interdição, entre a realidade psíquica e a realidade social, entre o inconsciente e o consciente.
Nesse sentido, o contrato social, o socius será sempre marcado por essa cisão e fragilidade de coesão, marcado pelo conflito e a violência em estado latente mesmo que se erija a civilização com suas instituições organizadoras.
Ocorre que na pós-modernidade, contexto escolhido para a nossa discussão sobre as instituições familiares, esse laço social parece estar ainda mais fragilizado, seja pelo enfraquecimento de instituições, valores e práticas ordenadoras de sentido, da noção de Lei e do próprio Estado.
Como elementos-pivôs desse enfraquecimento do laço social, temos refletido sobre o prevalecimento de uma tríade articulada entre individualismo, narcisismo e hedonismo.

A tríade do desenlaçamento social e familiar: Individualismo-Narcisismo-Hedonismo
Diante do enfraquecimento do socius, ou seja, quando o social se esvazia em seu papel de fornecedor de sentido ou de verdade formular (GUIDDENS, 1995), o indivíduo passa a sofrer as conseqüências e reage da forma como pode, sendo na maioria das vezes, de forma alienada, patológica e sem a devida reflexão de si.
            Diversos autores já citados que teorizam a pós-modernidade, apontam alguns elementos enfraquecedores do laço social e, portanto, com impactos nos processos de subjetivação contemporâneos.
            Elegemos a tríade Individualismo-Narcisismo-Hedonismo como elementos operantes de forma indissociada na atualidade e com profundas relações com esse enfraquecimento do laço social pós-moderno e sua conseqüente modificação dos processos de subjetivação.
Lipovetsky (1983) designa esse nosso tempo como “era do vazio”, onde se “substitui” o interdito pela fruição e um clima de liberação do registro da Lei; O filósofo fala de uma “sociedade pós-moralista” caracterizada pelo hedonismo, pelo desinvestimento público, pela perda de sentido das grandes instituições e referências morais, sociais e políticas, e pelo consumo exacerbado.
            Dumont (1985) discute o conceito de individualismo como criação ideológica da modernidade e Lasch (1983) caracteriza esse tempo de narcísico a partir da personalidade e da cultura norte-americanas, o que podemos estender ao mundo ocidental e acolher como traço subjetivacional na pós-modernidade com íntima relação com o de narcisismo.
Operando como uma liga entre individualismo e narcisismo, como elemento chave no estabelecimento de ordem e valor, está o hedonismo facilitado pelo acesso imediatizado pelos avanços da técnica em todos os setores da vida e pelo consumo estimulado e financiado em suaves prestações.
Nesse sentido, felicidade como categoria e horizonte maior, e talvez com certo espectro coletivo, reduz-se ao prazer imediato e individual, a um hedonismo individualista e narcísico.
Supomos que essa tríade pós-moderna encontraria solo fértil no sistema capitalista que oferece mais que bens materiais, mas, sobretudo meios simbólicos de existir, e ainda o consumismo como forma privilegiada de funcionar nesse sistema como elementos em franca relação com o laço social e os processos de subjetivação.
Nos deparamos no social contemporâneo, com um problema de como viabilizar esse modo de ser individualista, narcísico e hedonista num contexto do capitalismo e do consumismo, ou de outra forma, de como existir como sujeito e família.
Perseguimos a resposta de Bauman (1998) segundo o qual na pós-modernidade, a ordem e a limpeza como categorias que caminham com a civilização seja nas dimensões estética, moral ou ideal, são traduzidas numa nova forma perniciosa de purificação e seleção operados pelo mercado capitalista que elimina os “consumidores falhos” e aqueles que não podem consumir, considerados de novos impuros (BAUMAN, 1998: 20).
            Esses modos de existir mediados pelo capital e pelo consumismo se constituem problema para sobrevivência real e psíquica, posto que os processos de subjetivação dos sujeitos estão marcados por essa malha invisível que vem enfraquecido laço social e familiar ao potencializar a agressividade humana latente e intensificar um conflito permanente entre o indivíduo e o social.
            Se a caracterização da pós-modernidade possibilita levantar alguns de seus elementos enfraquecedores do laço social, podemos nos indagar sobre seus impactos sobre a vivência dos sujeitos nas mais diversas configurações familiares.

Desenlaçamento do laço familiar
Estamos cientes do cuidado em estabelecer relações causais entre mudanças sociais da pós-modernidade, os processos de subjetivação e os laços sociais, onde as novas formas de subjetividades ou os processos de subjetivação ocorreriam por escolhas pessoais em contraposição ao poder familiar e da tradição.
No entanto, não podemos descartar que essas mudanças subjetivas acompanhariam as mudanças sociais e econômicas, nem tampouco que essas mudanças nas formas de vida/subjetivação venham ocorrendo de forma tão rápida que não houvera tempo para sua preparação ou assimilação.
Não podemos desconsiderar a existência de uma crise de valores e referenciais, levando a um estado de confusão no campo das valorações e nos modos de vida, sejam pessoais, interpessoais, familiares e sociais.
Podemos destacar uma crescente substituição de valores coletivos e sociais (aqueles que se relacionam com a responsabilização pelo outro, por exemplo) por outros meramente individuais, noções como amor e companheirismo substituídos pela mera relação de troca nas relações sociais e interpessoais que tornam vazias de conteúdos subjetivos e se reduzem a jogos de interesses e benefícios.
Essa substituição e mudança de valores seriam decorrentes ou acompanhadas do enfraquecimento de instituições sociais como o Estado, a religião e a lei, como que criando para o sujeito pós-moderno um vácuo de sistema orientador (daí o predomínio do consumismo e mercantilismo que atribuímos à lógica/sistema capitalista).
Nesse sentido, defendemos que seja útil estabelecer relações entre a pós-modernidade, a modificação no laço social e os diversos tipos de sofrimentos psíquico e sociais, individuais, familiares e sociais.
E a família, seja qual for sua configuração, estaria marcada por esses impactos ‘psicossociais’, quais sejam a ênfase em conquistas/prazeres individuais, a indisposição ou imaturidade para o desfio das relações, o predomínio de relações egocentradas e infantilizadas e a inexistência de projetos comuns.
Diante desse estado de coisas, os públicos que sofrem maior impacto e se tornam as maiores vítimas tem sido as crianças e adolescentes, posto que a família tem sido marcada pela fragilidade ou inexistência de vínculos saudáveis de pertencimento e amor, pela falta de disposição ou condição psíquica e emocional para se constituir num locus e modo de relacionar saudável que não permeado pela violência.
Nesse cenário social maior e em especial de instituição plural de família, onde os processos de subjetivação se tornam cada vez mais empobrecidos, onde se cronificam a des-responsabilização e a incapacidade de envolvimento com/pelo outro, e onde as instituições ordenadoras de sentido se enfraquecem, defendemos a necessidade de indagar sobre o papel e contribuição de saberes como a Psicologia e o Direito.

Desafios à Psicologia e ao Direito
            Se a Constituição Brasileira promulgada em 1988 apresenta avanços acerca das relações sociais e civis, com aberturas a novos modelos familiares, deve ser “explorada” pelos campos do Direito e da Psicologia no sentido da acolhida da multiplicidade de configurações familiares pelo viés da dignidade.
            A Psicologia e o Direito devem fazer um exercício vigilante acerca das rápidas modificações familiares e dos processos de subjetivação de nosso tempo; cabe investigar e contribuir para respostas aos novos desafios éticos, sociais, técnicos e ideológicos, sobretudo no suporte e fortalecimento desses modelos familiares.
Sejam a Psicologia e psicanálise como “ciências do singular” e “saber desnaturalizante” não devem se ater às generalizações, mas somadas ao campo jurídico podem contribuir para essa temática das novas configurações familiares, fortalecendo seu processo de instituição na lei e no social.
Nesse sentido, tanto a Psicologia e o Direito devem evitar o risco de privilegiamento de um determinado modelo familiar, sejam o nuclear, sanguíneo e patriarcal incrustados em nossa subjetividade e práticas judaico-cristãs, mas buscar um aprofundamento nos estudos desses outros modelos e arranjos familiares, de forma a assegurar sua legitimidade jurídica e psíquica.
Sobre as transformações levantadas e em decorrência da pós-modernidade, sejam sobre os laços sociais e sobre os laços familiares, supomos que hajam fortes repercussões reais e subjetivas que podem ser mote de investigação pelos dois campos articulados do Direito e da Psicologia.
Talvez algumas pistas de atuação articulada desses saberes na atualidade sejam a contribuição para a formulação de dispositivos sociais e jurídicos de suporte ao sujeito, às diversas configurações familiares e ao laço social.
Esses dispositivos podem ser as diversas políticas públicas de Estado que favoreçam a dignidade humana e o direito à identidade individual e familiar.
Num ethos marcado pelo enfraquecimento dos laços sociais e, portanto, dos laços familiares, caberiam ao Direito e a Psicologia fortalecerem a lei, talvez numa certa “suplência da lei”, num fortalecimento de um ambiente em que o múltiplo e o plural não sejam motivos para um esvaziamento de sentido, ordenação e referência.

Referências
BAUMAN, Z. O mal-estar da pós modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998

BAUMAN, Zigmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
BECK, Ulrich. A reinvenção da política: rumo a uma teoria da modernização reflexiva. In: Modernização Reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista. 1995.

BERGER, P. L. e LUCKMANN, T. Modernidade, Pluralismo e Crise de Sentido – A Orientação do homem moderno. Petrópolis/RJ: Vozes, 2005
BRANDÃO, Eduardo Ponte; GONÇALVES, Hebe Signorini. Psicologia Jurídica no Brasil. Editora Nau, Rio de Janeiro, 2004.

DUMONT, Louis. O individualismo: uma perspectiva antropológica da ideologia moderna. Rio de Janeiro: Rocco, 1985.

ENRIQUEZ, Eugène. Da Horda ao Estado. Psicanálise do Vínculo Social. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990.

GIDDENS. Anthony. A Vida em uma sociedade pós-industrial. In: Modernização Reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista. 1995.

FREUD, Sigmund. (1913). Totem e Tabu e outros trabalhos Edição Standard Brasileira das Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: vol. XIII. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1996.

LASCH, Christopher. A Cultura do Narcisismo: A vida americana numa era de esperanças em declínio. Rio de Janeiro: Imago, 1983

LIPOVETSKY, Gilles. A Era do Vazio: ensaio sobre o individualismo contemporâneo. Lisboa: Relógio D’Água. 1983.

LIZARDO DE ASSIS, C. Famíliafeto: A família como laço afetivo no Direito e na Psicologia. In: I Congresso Nacional de Psicanálise, Direito e literatura (anais), Faculdade Milton Campos, Nova Lima-MG, p. 286-300

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades Familiares Constitucionalizadas: para além do numerus clausus. In.: Revista Brasileira de Direito de Família, v.3, n.12, Porto Alegre: IBFAM, 2002.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concumbinato e união estável. Belo Horizonte: Del Rey, 1994.




[1] Artigo originalmente apresentado e publicado junto ao 1° Congresso de Psicologia Jurídica: uma interface com o direito, promovido pelo CRP-04, UFMG, 30/set a 02/out., Belo Horizonte, MG
[2] Psicólogo. Mestre em Psicologia/Processos Psicossociais-PUC MG; Doutorando em Psicologia/USAL-AR. Docente das Faculdades Integradas de Cacoal. Email: kebelassis@yahoo.com.br




[Cena] Acadêmica/Social:

Assistência Psicológica a estudantes da Escola Municipal Santos Dumont, Cacoal-RO








Ocorrida em Cacoal, no dia 20 de outubro de 2011, com 40 crianças de 06 a 12 anos, por solicitação da  Secretaria da Saúde, devido a uma situação de falecimento de criança em acidente de trânsito. Ministramos assistência psicológica de forma coletiva, junto aos colegas da criança, demais estudantes da escola e professores.

Orientação para submissão de trabalhos: 1) Público-alvo: estudantes, pais, educadores; 2) Pede-se linguagem acessível, de contribuição psicossocial, mas sem o formato acadêmico clássico; 3) Priorizar temática com relevância social, a partir do campo psi em suas mais diversas teorias e abordagens; 4) Formato do artigo: média de 800 palavras, fonte garamond 12; 5)Metodologia “Cenas”: buscar a seqüência de “cenas” cotidiana, contemporânea, pática e outras (profiláticas/interventivas etc); 6) Além de artigos, poderão ser submetidos materiais inéditos de outros formatos: poesia, charges, crônicas, breves contos etc 7) Email para envio: kebelassis@yahoo.com.br





[Cenas] é um periódico de psicologia e psicanálise, de produção independente e pode ser reproduzido desde que citados a fonte e a autoria; objetiva a discussão das cenas humanas na atualidade, em perspectivas psi, multidisciplinares; tem por base conceitos como acessibilidade, sociabilidade e conhecimento com relevância social criador e editor: Cleber Lizardo de Assis edições anteriores para baixar e circular: http://cenasdecadadia.blogspot.com



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